Novo Centro Cívico de Maringá - O futuro não demora

Era uma vez um sonho. Nele um homem visualizava o futuro. Sua visão passou a ser tão forte que contagiou os demais homens. Em pouco tempo todos podiam ver o futuro que ele via. 
Entrevista com Tomas Dryjski da francesa Archi5
(Mais infos: www.architecturenewsplus.com )





A matéria acima foi publicada na Revista ObraPrima de julho 2012. 

Se você  teve dificuldade ma leitura acima, leia a matéria na íntegra:

O futuro não demora
Projeto do Novo Centro Cívico, premiado como melhor Master Plan da América Latina está entre os dez tops do mundo.
Texto: Angela Vicente
Imagens: ARCHI5
 Para a maioria das pessoas o futuro representa uma dose de incerteza. Se falarmos emvinte, vinte anos então, é improvável ter uma ideia clara de onde estaremos e como serão os detalhes do nosso entorno. Mas cidades se constroem por visões.  Al Maktoun quando pensou em Dubai Internacional, teve um sonho. Acordou no meio da noite, chamou seus súditos e revelou o futuro. Depois a tarefa foi criar cada detalhe conforme aquela visão. Anos e anos se passaram, com centenas de arquitetos, engenheiros e milhares de trabalhadores envolvidos para criar a capital turística e econômica do mundo árabe como a conhecemos hoje. Nos tempos antigos, a projeção das cidades por gênios como Hipódamo de Mileto, acontecia pela força e vontade do império. Outro projeto, mais próximo da nossa realidade, é a construção de Brasília. Erguida do nada, sobre um ponto no mapa, a capital foi construída com linhas imagináveis para a época. São somente alguns exemplos dentre um universo de projetos que construíram as melhores cidades do mundo.  
 Sem ir tão distante no tempo e no espaço, nos remetemos a aqui e ao agora. Para ser mais precisa, aqui e no futuro. Maringá é uma cidade com vocação para ser seguida e admirada. É uma cidade que dá certo e esbanja qualidade de vida para seus moradores. E o que vem adiante? Será que nós maringaenses estaremos fadados ao sucesso de uma cidade livre de emissão de carbono? Uma cidade sem automóveis circulando nas ruas centrais? Nos dias de hoje, essa ideia é quase impensável.  Como também pode ter sido, há dez anos, para os milhares de milaneses que desde 2008 não podem transitar automatizados pelo centro histórico de Milão (IT), ou para os parisienses que, com muito orgulho, se deslocam em metrô e bicicletas pelas principais travessas da encantadora Paris (FR). E nós? Como vemos um centro cívico moderno e sem carros? Ruas que são passeios enlaçados com edifícios de mais de sessenta andares, praças com fontes de água reaproveitada, eletricidade proveniente de painéis fotovoltaicos, bicicletas e muito, muito verde. Esta é a visão que o arquiteto Thomas Dryjski disponibiliza para o futuro de Maringá.

Parceria com a Arq+ Arquitetura
Desde o inicio do projeto, consolidou-se uma parceria entre a francesa ARCHI 5 e a maringaense Arq+ Arquitetura. Os Arquitetos Edson Cardoso e Jeferson Pereira seguem, em primeira pessoa, todas as iniciativas ligadas ao projeto. Os profissionais foram de vital importância para fazer os estudos preliminares e a adequação do projeto à legislação local.  Edson Cardoso confirma que o projeto é passível de muitas alterações principalmente no que refere à compatibilização com as necessidades do mercado e a urbanização. Tratando-se de um projeto publico-privado  muitas serão adaptadas para os diferentes usos: comercial, publico e residencial. A cidade deve funcionar como um todo, não é interessante que como resultado o projeto crie uma ilha na malha urbana.


 Certamente estar na vanguarda representa grande responsabilidade. Neste caso em particular, a responsabilidade ultrapassa o desenho arquitetônico e urbanístico; está alinhada com o meio ambiente e com a qualidade de vida. Utopia? Para Al Maktoun e para Getúlio Vargas* foi à visão do futuro.  E para nós? Estamos preparados para transformar o nosso modo de vida e dar lugar ao novo? Com certeza será um exercício diário que deve ser recebido como a novidade das boas brisas da primavera.

*Decreto N 32.976 de 08 de junho de 1953.
Verifique:http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1950-1959/decreto-32976-8-junho-1953-337949-publicacaooriginal-1-pe.html


Em entrevista inédita e muito descontraída, Thomas Dryjski, o arquiteto Francês da Archi5, apresenta os detalhes do Novo Centro Cívico de Maringá

Um gaulês na terra do ingá
OP. Como aconteceu o convite para trabalhar em Maringá?
TD. Risos.. Aconteceu através de uma rede de amigos do meu cliente. Eles viram o nosso trabalho em Estocolmo e entraram em contato. Logo apresentamos o nosso portfólio e começamos a conversar sobre as necessidades do projeto. Tivemos algumas reuniões e  em algum tempo fomos contratados.
BOX: Os analistas do Grupo deste empreendimento estudaram o perfil e know how da equipe francesa Archi5, e revelam que entre as suas escolhas havia também um arquiteto australiano e um inglês, cujos nomes não nos foram revelados. A escolha foi baseada na experiência acumulada pela Archi5, que estava mais alinhada com os objetivos e com o desafio proposto.
 Estudos preliminares
OP. : Como surgiram os desenhos?
TD. O que fazer com o contexto? Como será tudo isso? O grupo que nos contratou pediu para fazermos algo simbólico, especial. No primeiro estudo que apresentamos parecia tudo muito louco. (Risos) Era ultramoderno. Mas era demasiado. Maringá apresenta uma topografia muito particular. Procuramos criar relevos no projeto que dessem continuidade às linhas existentes. Apresentamos duas, três, quatro hipóteses até chegar no projeto atual.
 O projeto
OP.: Existe uma ligação entre o que propõem e o que já existe?
TD. Mantendo a ideia de valorizar o relevo criamos um desenho que busca dar continuidade sem ser demasiado futurista. As ruas e as curvas da cidade estão linkadas ao projeto É um centro que funciona com o desenho geral, ele está contextualizado, é parte de tudo que já existe. Uma das primeiras coisas que nos interessou foram as redes verdes já existentes. A ideia foi aproveitá-las e levá-las para dentro do projeto. Na nossa proposta, as três avenidas Brasil, Mauá e Centenário interceptam a área do projeto e podem fazer parte dele. 
Escalas e elementos
 OP.: Tudo será diferente?
TD.Fizemos um estudo para ter uma analogia com as medidas das quadras já existentes na cidade.  Aproveitamos a pista do antigo aeroporto que está inserida no projeto. Quando pensamos nisto, havia duas questões envolvidas: a história da cidade que deve preservar as suas memórias e o custo de demolição da pista. Visto isso, decidimos valorizá-la no projeto.
 Geometria sobre o relevo
OP.: Todas estas linhas estão relacionadas?
TD. Conforme traçávamos todos estes elementos, foram surgindo triângulos e formas que ao serem empurradas criam torres. Por fim elevamos quatro edifícios que fitam os triângulos e possuem dois lados sem cortes ou interrupções. Tudo está ligado e parecem naturais. A forma dos edifícios é tão forte que permite ter dentro deles diferentes possibilidades, mas mantém a mesma forma. Não é uma questão de fachadas. Possuem dois eixos, um que olha para a cidade e o outro que olha para um edifício central.  A estrutura é muito original. Esta foi uma ideia estratégica com um sistema que se pode adaptar a demanda. Funciona com nada, com pouco ou com mais. Funciona com muitas demandas. Com um limite de 250 metros de altura.
Destaque: O Novo Centro Cívico está entre os dez melhores Master Plan do mundo.
250 metros de altura?
 OP.: Então, vocês pensam em fazer torres como a de grandes cidades?
TD. Sim. Se dividirmos estes 250 metros por 3,5 metros (pé-direito) temos setenta andares aproximadamente. É um tamanho de cidade metrópole, não é uma loucura. Mas isto irá depender da demanda. A altura é flexível. Estas torres podem ter menos andares conforme a necessidade que se apresente.
 Torres mistas
OP.: A proposta apresenta edifícios de múltiplo uso?
TD. Não vimos em Maringá edifícios que funcionem sempre. O ideal é ter edifícios mistos: residencial, comercial e público. Isto permite que a cidade viva de dia e de noite. Habitar e dispor dos serviços na mesma área otimiza recursos energéticos. No projeto é fácil imaginar as diferentes tipologias colocadas nas formas dos edifícios. Lojas na parte inferior e apartamentos na parte superior.  
Mesclar programas de uso é ganhar vida de dia e de noite.”
Sustentabilidade
OP.: Estão contemplando os princípios de construções com baixo impacto ambiental?
TD. Nos preocupamos com três fatores: social, ambiental e a qualidade de vida. Todo o projeto tem eficiência energética, embora o Brasil ainda esteja em um momento incipiente, e isso é natural avaliando a juventude do país e suas características, nós projetamos pensando em otimizar os recursos naturais. Existem maneiras simples de fazer a gestão de reuso das águas cinza e da chuva sem usar tecnologia avançada, e isto foi uma das questões contempladas no projeto. 
Outro elemento simples e que traz benefícios enormes é a questão de usar o ar para ventilar. Abrindo um andar temos a entrada de ar necessária para a ventilação. O mesmo se aplica ao sol. Basta locar a base do edifício na posição ideal para aproveitar ao máximo este recurso natural. Tudo depende do que se quer.   
Posicionamos os edifícios de forma tal para que uma torre não faça sombra no outro, nem sombreie as pistas e praças. Os prédios funcionam como base para áreas de passeio para pedestres, se caminha no teto verde que funciona como isolante térmico.
 A pé
OP.: Estes parques verdes, isto é real?
TD. Sim. È a proposta. Ao longo das ruas se caminha, se encontram exposições de arte...propomos a reflexão de que não é necessário usar o carro sempre. Propomos ruas para pedestres com acessibilidade, onde todos podem transitar.

 OP. Materiais.
 O arquiteto tem que pensar nos materiais e na mão de obra que serão usados para executar o que propôs, planejou e projetou. Você acredita que estaremos em condições de suprir estas necessidades?
TD. Penso que dois anos não tínhamos muitas opções de materiais nesta região. Inicialmente pensamos que isso poderia ser um problema. Mas observamos mudanças rápidas. Acredito que estamos em um ponto de inflexão. Os fabricantes querem entrar no mercado e a tecnologia construtiva deve mudar, ela precisa mudar, pois aqui no Brasil em geral ainda está muito atrasada. Nos dois últimos anos esse processo acelerou e agora achamos que os materiais e as técnicas não serão um problema. Agora temos aqui os mesmos materiais que na França, na Suíça, na Bélgica... Existe um outro lado da questão. Na essência o projeto é flexível. Ele tem um conceito inovador, não existe motivo para que sejamos engessados. Se aplicar uma tecnica absolutamente nova irá custar uma fortuna, tudo perde o sentido. Buscamos o equilíbrio entre o que queremos fazer e o que se pode fazer com a tecnologia atual.  Todos os nossos projetos são executáveis. Temos como premissa que aquilo que desenhamos é o que se constrói. Por exemplo, no projeto do estádio que fizemos criamos três arcos. Todos diziam que não era possível construir. Nós procuramos o engenheiro certo, que investigou o modo para executar e afinal está construído.
 “Buscamos o equilíbrio entre o que queremos fazer e o que se pode fazer com a tecnologia atual. Todos os nossos projetos são executáveis. Temos como premissa que aquilo que desenhamos é o que se constrói.” 
 O.P. Maringá comporta?
Acho que é um challenging, todo o que propomos é uma transformação muito grande no modo em que se constrói e se vive atualmente em Maringá. Temos tido reuniões na prefeitura de Maringá que são incríveis. Estamos propondo ruas especiais para pedestres e para ciclistas; o automóvel não está presente no futuro das cidades. Isto atualmente é inédito para a cidades. Mas imagina tudo isto daqui a quinze – vinte anos? Na escala de master plan este tempo é muito curto. E quando o futuro chegar, o projeto deve ser atual para a época. É natural confrontar as ideias. Mas é muito importante acreditar no projeto. Por enquanto, a maior parte das pessoas que estão vendo as imagens que apresentamos não possuem informações suficientes para acreditar nele. As imagens são sedutoras, mas o projeto é muito mais do que isso.
“E quando o futuro chegar, o projeto deve ser atual para a época. É natural confrontar as ideias. Mas é muito importante acreditar no projeto. Por enquanto, a maior parte das pessoas que estão vendo as imagens que apresentamos não possuem informações suficientes para acreditar nele. As imagens são sedutoras, mas o projeto é muito mais do que isso.”
 Entorno
OP: Um projeto como este pode contagiar?
Seria fantástico se as ideias do projeto se estenderem para fora dele. Se interagir com a cidade significa que alcançamos mais um objetivo e demonstra que o projeto é bom. Induzir uma transformação no entorno é muito positivo para um projeto como este.
Estudantes de arquitetura
OP: Que recado você pode transmitir para os futuros arquitetos?
TD.Trabalhem com a vontade de fazer o que querem fazer e não o que se faz comunmente. E se  vocês conseguem provar que é possível, então se sintam realizados. Antes deste projeto não existiu nada parecido. E precisamos trabalhar muito para que tudo isso que criamos saia do papel.

Archi5 no mundo
Embora não pertença a personalidade do arquiteto a qualidade de vangloriar-se de seus feitos, o escritório ARCHI5, onde é sócio, vem desenvolvendo projetos de grande importância para a arquitetura contemporânea.  Venceram o concurso internacional para o planejamento do Bairro Nya Årstafältet, em Estocolmo, na Suécia. Prêmio que lhes rendeu a indicação para projetar o Centro Cívico de Maringá. A proposta da Archi5 no concurso, intitulada ‘Arkipelag’, foi desenvolvida em colaboração com o arquiteto paisagista Michel Desvigne.
O Master Plan Arkipelag teve como objetivo a melhor articulação da área em relação ao entorno, e criando uma área humanizada, com diversidade e a construção de uma sociedade urbana sustentável. Para tal, a Archi5 apresentou um projeto original, criado sobre eixos e praças com uma postura visionaria que permite varias possibilidades de uso, sempre caracterizada pela convivência comercial e residencial.

Nota de imagem: O Master Plan  de Maringá foi premiado pela WAF - World Architecture Festival – em Barcelona,  ficando entre os dez melhores Master Plan do mundo e o melhor da América Latina.

Nota de imagem: Midia Library – Mont de Marsan (França)
Se trata do projeto originalíssimo de uma biblioteca com salas de leitura divididas por corredores a céu aberto. Curiosos perguntamos: - E a chuva? Thomas respondeu: - Ah! Sim..Quando chove os corredores viram córregos...mas está construído em uma região da França onde chove muito pouco. Igualmente é muito divertido e as pessoas estão muito felizes com ou sem chuva.
Foto: Escola Primária na França livre de emissão de carbono. 


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